domingo, 20 de fevereiro de 2011

O maior desastre natural do Brasil

Todos os anos uma triste catástrofe ocorre na região mais povoada do país. Pela sua constância deveria ser tratada como algo de prioridade máxima. Mas, por esta catástrofe ser cíclica e, em sua maioria, castigar setores mais pobres da população os políticos pouco se mobilizam e não fazem desta tragédia uma política pública.
A mais recente foi a maior tragédia natural de todos os tempos no Brasil, os deslizamentos e a morte de 905 pessoas na região Serrana do Rio de Janeiro que suplantou os 785 mortos, também, no estado fluminense em 1967.
            Essa tragédia é constante. Em janeiro de 2010, em Angra dos Reis, 52 pessoas foram mortas por escorregamentos. No final de novembro 2008, uma tragédia ocorreu no Estado de Santa Catarina, deixando 135 mortos e 32 mil desabrigados, além de SC, em Minas Gerais as enchentes, em 2008, foram responsáveis por 30 mortos. Não bastando essas catástrofes, no Rio Grande do Sul por efeitos das chuvas 12 pessoas morreram naquele ano.         
             Os escorregamentos e enchentes ocorrem entre os meses de outubro e março, justamente no período das chuvas no sudeste e sul brasileiro. Nos últimos anos, centenas de pessoas morreram vítimas dos deslizamentos e enchentes. As perdas materiais não sobrepujam as vitimas, mas os estragos podem ser vistos nas estradas, pontes, residências, contaminações fluviais e perdas dos bens materiais dos sobreviventes. 
            As regiões Sudeste e Sul agregam sete estados da federação e todos eles são importantíssimos para a economia brasileira. A maior parte da região Sudeste é ocupada pelo domínio morfoclimático dos Mares de Morros. Este domínio é extremamente complexo e único, não existe em nenhuma parte do mundo uma região que agregue altíssima biodiversidade, planaltos e escarpas cristalinas, clima Tropical e forte rede hidrográfica. A região Sul também possui uma geografia de planaltos elevados, sendo uma área, climaticamente, de transição e encontro de massas de ar.
            Mas a posse desta macro-região, ocorrida desde 1500, foi apenas com a intenção do avanço econômico e sem visualizar as potencialidades ecológicas e ambientais. Atualmente, se notam as conseqüências desta posse tão equivocada e arbitrária efetivada pela ganância e pressa do ser humano.
      
    Histórico
  • Séculos XVI - XVII– Portugueses ocupam o litoral e efetivam a extração do pau-brasil e o plantio da cana-de-açúcar.
  • Séculos XVII – XVIII – Período de forte desmatamento na Mata Atlântica mineira pela Mineração e agricultura de abastecimento.
  •  Século XIX – XX – Cafeicultura devasta grandes áreas de São Paulo e Rio de Janeiro.
  • Século XX – Rápida Urbanização e intensa industrialização no Sudeste. As maiores cidades brasileiras estão localizadas na Mata Atlântica. A Ong SOS Mata Atlântica informa que menos de 7% da floresta subsiste.
   Domínio dos Mares de Morros
Um domínio morfoclimático relaciona as características climáticas, geológicas, topográficas e vegetais. No domínio dos Mares de Morros estas características são marcantes.
  • Clima Tropical Litorâneo = Quente e úmido, influenciado pelas massas de ar mTa, mTc, mEc  e mPa. Duas estações marcantes, forte umidade no verão e diminuição da pluviosidade no inverno. O litoral recebe ventos úmidos vindos do mar.
  • Geologia e relevo = Os planaltos e serras leste – sudeste atlântico possuem estrutura formada por escudos cristalinos. Estes planaltos e escarpas compõem relevos de razoável média altimétrica (1200m) e foram fortemente erodidos pelas águas de origem pluvial e fluvial, dando o formato de meia laranja ou mamelonares. Os solos nestes morros foram fixados pela atuação da Mata Atlântica, que protege a cobertura pedológica da ação direta das chuvas. Deslizamentos são naturais em áreas que estão encharcadas.                                                                            
  • Vegetação = A Mata Atlântica é o Bioma de maior biodiversidade do Brasil, pois agrega clima quente e úmido, está localizada em um relevo irregular, ultrapassa a latitude tropical, entra em contato com outros biomas e se estende pela faixa litorânea norte-sul. Composta por vegetação perenefólia, ombrófila e caducifólia é extremamente densa e complexa. E sua fauna é riquíssima.
  • Hidrografia = Rios de pequena extensão no sentido planalto – litoral, porém o planalto atlântico direciona as águas das chuvas para o interior do país formando volumosas bacias hidrográficas. Ex.: Bacia do Paraná e São Francisco.

Ocupação

   Mais de 60% da população reside na faixa litorânea que vai de norte a sul do litoral brasileiro. Grandes cidades brasileiras estão localizadas na antiga área de Mata Atlântica e encravadas sobre os planaltos litorâneos. Não existe nenhum problema residir nestas áreas, mas o abuso urbano transformou a ocupação num grande problema.
   As cidades de Salvador – BA, Belo Horizonte – MG, Zona da Mata mineira, Rio de Janeiro – RJ, cidades serranas –RJ e São Paulo (capital) cresceram aceleradamente e sem nenhum projeto de ocupação dos planaltos mais elevados. O núcleo destes centros urbanos, geralmente, está localizado em micro bacias existentes entre os planaltos, mas a periferia foi direcionada para as encostas destes morros.
   Os habitantes destas periferias, além de numerosos são despossuídos de recursos para a construção de suas casas. A ocupação dos morros se dá pela destruição total da vegetação e a edificação de casas escoradas umas nas outras.
   Consequentemente o solo fica exposto às águas pluviais e encharca-se, a rocha cristalina que está sob este solo não é capaz de reter esta massa de terra, facilitando o escorregamento. Não é raro sobre estes morros encontrar rochas enormes desagregadas, conhecidas por “Matacões”. A vegetação tem um fundamental trabalho de fixar estas rochas, mas com a retirada da floresta o solo escorrega levando consigo estas enormes pedras, aumentando o desastre.
O Professor Luiz F. Vaz, convidado do Instituto de Geociências da Unicamp, explicitou o fato em artigo no jornal O Estado de S. Paulo:
“O mecanismo desses deslizamentos segue o mesmo padrão: alguns meses consecutivos de chuvas contínuas, não necessariamente fortes, seguidos por um período concentrado de precipitações muito fortes; os vazios da camada de solo ficam saturados pelas chuvas contínuas, reduzindo a resistência do solo; como a água da chuva forte não tem como se infiltrar, escorre pela superfície, transformando o solo em lama e carregando árvores e blocos de rocha. Esse processo é conhecido como corrida de lama, pela alta velocidade do deslizamento, que pode chegar a algumas dezenas de quilômetros por hora.”
Todos os anos esses acidentes se repetem. Para piorar a situação a bacias sedimentares formadas no domínio mares de morros recebem intenso fluxo hidrológico. No entanto a urbanização impermeabilizou o solo e aumentou o volume d água dos rios que passam pela área urbana. As enchentes são devastadoras e deixam milhares de desalojados e desabrigados.
 Para piorar o quadro os solos são formados por vários materiais e as estruturas geológicas são segmentadas e complexas. Obras para grandes edificações como; túneis, metrôs, pontes e prédios devem receber um planejamento adequado e sério.

Tragédia atual

·                    Região Serrana do Rio de Janeiro, janeiro de 2011, 904 pessoas mortas. Nova Friburgo, que registrou 426 vítimas fatais. Teresópolis contabiliza 381 mortos, Petrópolis 71, Sumidouro 21, São José do Rio Preto quatro e em Bom Jardim um morador faleceu. Somando os desabrigados e desalojados estão 28 mil pessoas. Ainda existem por volta de 400 desaparecidos.

Tragédias antigas

·         Angra dos Reis, 2010, 52 mortos.
·         Alagoas e Pernambuco, julho de 2010, 40 pessoas mortas.
·         No Estado de São Paulo 38 cidades estão em estado de emergência, 5400 desabrigados e 70 mortos.
·         Chuvas intensas no Vale do Itajaí – SC provocaram enchentes e deslizamentos; 135 mortos e 32 mil desabrigados. O governo catarinense estima as perdas materiais em mais de R$ 500 milhões, além de estimar as perdas com o turismo em R$ 125 milhões. Os municípios mais afetados foram Brusque, Blumenau, Itajaí e Indaial. As chuvas foram intensas durante dois meses. Essa instabilidade foi em decorrência da junção de vários fatores, entre eles; encontro das massas mTa e mPa, além de ventos fortes e úmidos formados no litoral e que se direcionaram para o continente. A altitude do relevo no litoral de Santa Catarina contribuiu para a intensificação das chuvas.
·         Janeiro de 2007, desmoronamento da obra na linha 4 do Metrô paulistano vitimou 7 pessoas, além de sérios problemas nas fundações arquitetônicas dos imóveis vizinhos.   
·         No estado do Rio de Janeiro em 2007 foram 30 mortos, 6.000 desabrigados e 7.000 desalojados e estradas intransitáveis.


Conclusão
As enchentes e escorregamentos são conseqüências de um quadro formado há muito tempo. A destruição e a péssima ocupação da Mata Atlântica e seu relevo foram os responsáveis pela situação caótica de todos os anos. 
 O Domínio dos Mares de Morros não é o responsável pelas desgraças ocorridas. Os aspectos vantajosos vencem as dificuldades aparentes. O clima da região é propicio para uma agricultura de produtos que demandam muita água. Os rios formados pelas chuvas e pelo relevo são altamente adequados à obtenção de energia elétrica. Os incontáveis recursos biológicos podem, ainda, enriquecer a indústria farmacêutica e de cosméticos do país. Além da beleza única do domínio que auxilia o setor turístico do Brasil.
A urbanização das cidades devem primeiramente obedecer ao padrão e resistência natural. As encostas devem ser urbanizadas pelo método de curva de nível, intercalado pela mata nativa. Um programa de re-distribuição urbana deve ser efetivado para oficializar as residências das encostas e re-alocar famílias em lugares mais seguros. O aparelho urbano para os milhões de habitantes dos morros brasileiros passa pela retomada do espaço natural.
Um entrave político é marcante para a solução destes problemas, as enchentes e escorregamentos são cíclicos. Passado o período das chuvas a calamidade é esquecida e é retomada a construção nos morros. Os problemas com as chuvas em SC são monitorados há tempo, pois, de acordo com a UFSC o estado já contabilizou 248 mortos, e 800 mil desabrigados, vítimas de catástrofes naturais entre os anos de 1980 a 2004. E uma das áreas de maior risco é o Vale do Itajaí.
Especialistas indicam que a união de todos os institutos que pesquisam as influências naturais, nas regiões de maiores riscos, é de suma importância. Os dados feitos por essas entidades ficam perdidos e nadam acrescentam para a prevenção e atuação após os desastres. A criação de um órgão federal único é urgente, pois esse órgão poderia reunir técnicos dos vários setores, geologia, geomorfologia, hidrologia, geografia, meteorologia e arquitetura, para traçar metas mais eficazes e duradouras.
O histórico já demonstrou que essas responsabilidades apenas delegadas para o poder municipal continuarão formando catástrofes, pois é sabido que os municípios ficam com a menor parcela dos impostos recolhidos e possuem baixíssimo poder de investimento, o órgão proposto deve ser de caráter federal e mais abrangente.  
As eleições, sejam elas do poder executivo e legislativo, ocorrem antes dos problemas começarem. As medidas para solução dos problemas raramente estão no debate eleitoral (dois em dois anos).
Na ocupação do Domínio dos Mares de Morros, desde o inicio, não foi respeitada a dinâmica ambiental. Hoje todos os moradores, ricos ou pobres, sofrem as conseqüências dos desastres naturais. A retomada da inteligência e dinâmica própria do quadro natural se faz necessário para existir um mínimo de boa relação entra a Natureza e os Cidadãos.

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